A equipe J.J. também entrevistou o dr. Wellington Luiz Villar, Promotor de Justiça Eleitoral, que ressaltou a honra de exercer a profissão e quais são os principais desafios de fiscalização. Questionado sobre a segurança da urna eletrônica disse: “Não há riscos no atual sistema de votação adotado no Brasil”. (G.R./J.B.)
J.J. – Como o senhor define exercer a profissão de Promotor de Justiça Eleitoral?
Dr. Wellington Villar – É uma honra, um motivo de muito orgulho, satisfação e realização profissional exercer esse importante papel dentro do Ministério Público para auxiliar na garantia do direito ao voto e no regular andamento das eleições.
J.J. – Quais são os principais desafios que o Ministério Público enfrenta ao fiscalizar as campanhas eleitorais em uma cidade pequena como Jales?
Dr. Wellington Villar – Não há desafios, se considerarmos a atual dinâmica do sistema eleitoral e a disponibilidade de informações em vários canais, especialmente nas redes sociais. Além disso, há o constante apoio da sociedade, que encaminha denúncias por meio dos portais eletrônicos da Justiça Eleitoral, do Ministério Público, bem como pelo aplicativo Pardal, da Justiça Eleitoral, e da mídia.
J.J. – Como funciona, de forma geral, um processo criminal, a partir do cometimento do crime, da investigação até o julgamento, com destaque para a atuação do Ministério Público nessa área eleitoral?
Dr. Wellington Villar – De acordo com a Resolução TSE nº 23.640/2021, a Polícia Federal exerce com prioridade a função de polícia judiciária em matéria eleitoral, portanto cabe a ela a investigação sobre os crimes eleitorais. Quando não houver órgão da PF no local da infração, caberá à Polícia Civil a atuação supletiva. Praticado o crime eleitoral, qualquer pessoa, verbalmente ou por escrito, poderá comunicá-lo à Autoridade Policial, MPE ou Juiz Eleitoral. Se a comunicação for para a Autoridade Policial, havendo indícios de autoria e prova da materialidade, instaurar-se-á Inquérito Policial para investigação do fato.
Caso a comunicação seja realizada para o Juiz Eleitoral, ele a encaminhará ao MPE ou à Autoridade Policial, requisitando-se a instauração de Inquérito Policial. Por seu turno, se a notícia for direto ao MPE, o “Parquet” requisitará ao Delegado de Polícia a instauração de Inquérito Policial. Importante mencionar que as Autoridades Policiais e seus agentes deverão prender quem for encontrado em flagrante pela prática de crime eleitoral, salvo quando se tratar de infração penal de menor potencial ofensivo, comunicando a prisão imediatamente ao Juiz Eleitoral, ao Ministério Público Eleitoral e à família do preso ou à pessoa por ele indicada.
No caso de infração penal de menor potencial ofensivo, como a chamada “boca de urna”, o investigado será conduzido à presença da Autoridade Policial, ouvido e liberado sob compromisso de comparecer em Juízo quando intimado. Como nos crimes comuns, 24h após a prisão de flagrado por crime eleitoral, haverá a realização de audiência de custódia, na qual o Juiz Eleitoral decidirá pelo relaxamento da prisão, concessão de liberdade provisória ou conversão em prisão preventiva. Os crimes eleitorais são todos de ação penal pública incondicionada, mesmo aqueles contra a honra, diferentemente dos crimes previstos no Código Penal. Após as investigações pela Polícia Judiciária, o inquérito é remetido ao Juízo Eleitoral e distribuído ao MPE, que tem 10 dias para oferecer a denúncia ou promover o arquivamento, quando entenda não haver justa causa, inexistir crime, etc. Recebida a denúncia pelo Juiz Eleitoral, o denunciado será citado e intimado a apresentar resposta à acusação. Mantido o recebimento após a defesa, designar-se-á audiência de instrução e julgamento. Após a instrução, o MPE e o acusado terão dez dias para oferecer alegações finais. O Juiz sentenciará o feito em 10 dias. Cabe recurso pelas partes ao TRE respectivo em 10 dias. Mantida a condenação, inicia-se a fase de execução da sentença penal no Juízo da Execução.
J.J. – Quais são as práticas eleitorais mais comuns que o senhor identifica como ilícitas nas eleições municipais?
Dr. Wellington Villar – Antes das eleições, as infrações mais comuns estão previstas: (a) no artigo 299 do Código Eleitoral (compra de votos); (b) no artigo 321 do Código Eleitoral (colher assinatura do eleitor em mais de uma ficha de registro de partido); (c) no artigo 323 do Código Eleitoral (divulgar fatos inverídicos na propaganda eleitoral – “fake News”); (d) nos artigos 324 a 326 do Código Eleitoral (calúnia, injúria e difamação em propaganda eleitoral); (e) no 348 a 350 do Código Eleitoral (falsificação documentos com finalidade eleitoral); (f) no artigo 33, parágrafo 4º, da Lei nº 9.504/97 (divulgação de pesquisa fraudulenta). No dia do pleito, as infrações penais mais comuns estão previstas: (a) no artigo 312 do Código Eleitoral (violar sigilo do voto – ex. usar aparelho de telefonia celular para fotografar o seu voto na urna eletrônica); (b) no artigo 39, parágrafo 5º, da Lei nº 9.504/97 (boca de urna).
J.J. – A criação da Lei da Ficha Limpa foi um progresso?
Dr. Wellington Villar – Fruto de um projeto de lei de iniciativa popular, a LC 135/2010 foi a primeira grande mobilização popular por uma questão política desde o movimento dos caras-pintadas que pediram o impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello. Só por esse aspecto, já é possível considerá-la um grande progresso. Mas, além disso, a LC 135/2010 é uma importante ferramenta de controle que auxilia a Justiça Eleitoral e a sociedade na defesa da probidade administrativa e da moralidade para exercício de mandato, por considerar a vida pregressa do candidato no momento dos registros das candidaturas.
J.J. – O senhor acredita que há um nível adequado de conscientização sobre os direitos e deveres eleitorais em cidades pequenas? O que pode ser feito para melhorar essa conscientização?
Dr. Wellington Villar – Apesar do amplo acesso à informação dos dias atuais, ainda se faz necessária a adoção de medidas para que a população em geral tenha conhecimento de seus direitos e deveres. Além da atuação do Ministério Público Eleitoral e da Justiça Eleitoral, com constantes divulgações sobre o papel da população nas eleições, as administrações locais, por meio de medidas educacionais e seminários, e a mídia são parceiros essenciais para que a população entenda o poder do voto, que é a principal ferramenta da accountability vertical, além de importante instrumento de controle social.
J.J. – A segurança da urna eletrônica é garantida?
Dr. Wellington Villar – Sim. Não há riscos no atual sistema de votação adotado no Brasil.
J.J. – Existe uma preocupação maior com a compra de votos em cidades pequenas? Quais são as estratégias para prevenir essa prática?
Dr. Wellington Villar – Não necessariamente. Qualquer conduta que influencie na lisura do processo eleitoral deve ser prontamente jugulada, seja ela praticada em grandes centros ou em cidades pequenas.
O fato é que nas pequenas cidades a compra de votos se torna mais evidente, uma vez que os habitantes geralmente se conhecem e, por vezes, sabem qual a opção política uns dos outros, havendo mais denúncias de compra de votos por conta disso. O combate à compra de votos não é tarefa fácil. Geralmente, o candidato ou correligionário pratica a compra de voto no imóvel do eleitor, no local de trabalho dele, ou seja, em logradouros em que não é possível a constatação do fato por outras pessoas ou autoridades e isso é compreensível. Vejamos. Tanto o candidato que compra quanto o eleitor que vende seu voto praticam crime eleitoral previsto no artigo 299 do Código Eleitoral, portanto, nem um e muito menos o outro vai realizar o ato na via pública ou na presença de outras pessoas. Na verdade, só a conscientização dos eleitores é capaz de sepultar essa odiosa prática da compra de votos.