O engenheiro agrônomo e ex-consultor em organização de produtores rurais Manoel de Matos de repende viu sua vida se transformar completamente, desde quando decidiu escrever e apresentar o monólogo “Somos Todos José”, que no início parecia uma provocação, mas logo foi crescendo e chamando a atenção de um público cada vez maior, como ele mesmo diz. Nesta entrevista ao Jornal de Jales ele afirma que na próxima sexta-feira, 27 de julho, véspera do Dia do Produtor Rural, está completando seis anos desde sua estreia no teatro, sendo que em 2021 estreou o seu segundo espetáculo: “Chico Santo e a Vaca Estrela”. Hoje ele viaja pelo Brasil com sua empresa Cia. de Teatro Manoel de Matos e está com a agenda para 2023 lotada. Atualmente ele soma mais de 370 apresentações em mais de 200 cidades de oito estados, com um público que já passa de 30 mil pessoas. (Luiz Ramires)
J. J – Como surgiu a ideia da sua primeira peça? Qual o seu objetivo?
Manoel de Matos – A ideia da peça surgiu a partir de provocações que, se em um primeiro momento parecia uma maluquice, se transformou em um grande desafio e agora, em uma grande paixão. Não me vejo mais sem fazer teatro. A proposta também foi se transformando. A descoberta do teatro como linguagem mudou meu conceito do que é trabalho e me conduziu para a visão da potência do teatro como agente de transformação de destino, de futuro, de abertura para um mundo melhor. E levar isso tudo, essa possibilidade para um monte de gente é uma coisa maravilhosa.
J. J. – É difícil criar e interpretar sem aquela caricatura pejorativa e sem descaracterizar o comportamento do homem simples do campo?
Manoel de Matos – Os personagens que crio e interpreto são gente da roça. É dar vida a parte da minha história e de muitas pessoas que conheci e com quem convivi em minha atuação como consultor em organização de produtores rurais por mais de 20 anos. A realidade da roça, por mais que por muitas vezes seja uma vida bastante dura e sofrida, é puramente poética. E quando se chega à captura dessa essência, sua representação no palco se torna mágica. Há uma grande identificação e ocorre um se transportar e se transformar de plateia em protagonista, por muitas vezes catártico.
J. J. – Como é misturar a agronomia com o teatro? Fica mais fácil para quem conhece os dois?
Manoel de Matos – Essa possibilidade somente é possível quando a intenção está centrada no ser humano imerso em sua condição humana, sem a fabricação de interesses ou de soluções que facilitem a vida. A vida como ela é, como dizia o maior dramaturgo.
J. J. – Você tem se apresentado muito?
Manoel de Matos – Gosto muito da alegoria da cigana. Se uma cigana ao ler minha mão há seis anos, me dissesse tudo que está acontecendo, não me restaria absolutamente nenhuma dúvida que ela estaria me enganando para conseguir algum dinheiro. Minha agenda está praticamente lotada para 2023, principalmente com a Bahia e Mato Grosso do Sul, em parceria com o Sebrae. E a cada dia surgem novas possibilidades. Parece um sonho.
J. J. – Quem é o seu público?
Manoel de Matos – No início de minha carreira como artista de teatro eu imaginava que meu público seria o produtor rural, gente da roça. Hoje vejo que são todas as pessoas que tem uma ligação direta, afetiva, de lembranças com o campo. E quem não tem?
J. J. – A repercussão sempre é boa?
Manoel de Matos – Essa é a maior satisfação. A forma como sou tratado após as apresentações também é uma coisa mágica. Acredito que algumas pessoas vivenciam momentos de grande emoção e que formam grande significado para elas. Quando alguém vem falar comigo sobre o espetáculo relatam sobre suas histórias de vida. Isso tem a ver com a condição humana em movimento.
J. J. – Você tem outros trabalhos ou pretende produzir alguma coisa nova?
Manoel de Matos – Tenho agora meu mais novo parceiro profissional, Felipe Facio, meu filho que está na faculdade cursando Produção Multimídia. Recentemente fizemos um trabalho de produção de um vídeo em homenagem ao produtor rural. Foi uma maravilha pela qualidade de nossa produção. Para nós, Gisele e eu, é emocionante ver nossa cria trilhando seu caminho com tanto talento. Vem um montão de coisas novas por aí. Tem também um novo espetáculo. Provavelmente vai se chamar “O Sonho de Antonho”, que vai tratar do jovem do campo diante de seu dilema: ficar ou ir embora da roça. Estou escrevendo o texto e produzindo ideias. É um projeto para o próximo ano.
J. J. – O teatro foi importante para o seu trabalho? Você teve bons mestres?
Manoel de Matos – O teatro mudou tudo. Mudou minha vida. Ou melhor, bagunçou tudo, que é a melhor coisa que o teatro produz: o caos. O teatro me ensinou o que é viver, me escancarou o sentido da vida e me ensina a cada dia o sentido que as pessoas podem ter em suas vidas. E algumas pessoas foram fundamentais nesse universo: Clayton Campos, Manoel Paz Landim, Higor Arco, Natália Giro e uma imensa legião de fazedores de teatro e de vida. Devo minha nova vida a todos eles. A Escola Livre de Teatro de Jales é um espaço de concretização para quem, em algum momento, se imagina vivendo nessa realidade, aprendendo a arte da interpretação pelos palcos da vida.