É notório que o cuidado dos brasileiros com a saúde é uma preocupação da classe médica. O tema prevenção está na pauta de todas as consultas, palestras e congressos. Na semana em que é comemorado o Dia do Cardiologista, em 14 de agosto, o Jornal de Jales conversou com o médico Manoel Ildefonso Paz Landim, formado pela Universidade Federal Fluminense e Cardiologista pela Sociedade Brasileira de Cardiologia, Mestre pela Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, Doutorando pela Famerp. Na entrevista o especialista falou sobre atualidades e fez importantes considerações sobre hábitos e informações às quais os pacientes devem estar atentos. (JB e GR)
J.J. – Por que escolheu ser cardiologista?
Dr. Manoel – A escolha pela especialidade começa ainda na graduação, pela natural afinidade que se tem pela disciplina e pelo exemplo de professores e especialistas. A confirmação só vem muito tempo depois, com a persistência e a identificação com os clientes atendidos. Também existe a troca de experiências com eles, garantindo se estar na especialidade correta. A cardiologia permite fazer parte do cotidiano das pessoas, de dividir com elas os seus anseios, de sorrirmos diante das experiências bem sucedidas e de repartirmos as expectativas na busca pelo melhor caminho.
J.J. – A Inteligência Artificial vem sendo incorporada em soluções para diferentes doenças cardiológicas, principalmente com o objetivo de aprimorar a avaliação cardiológica atualmente feita pelos especialistas. Essas inovações já estão chegando para os pacientes?
Dr. Manoel – A inteligência artificial é realidade não só na cardiologia, mas em todas as especialidades. Ela aprimora dados e oferece informações mais precisas. Porém, o objetivo não é substituir o médico. A IA está no campo do auxílio ao diagnóstico, assim como estão os outros exames já à disposição. Ela melhora quando se sabe usar com a visão correta. Um exemplo está no campo das imagens, onde novos conhecimentos puderam ser incorporados. Vejo com extrema preocupação a aquisição de instrumentos pela população, que podem levar a interpretações errôneas. Existem dispositivos que prometem diagnósticos, mas não têm um respaldo acadêmico. Um exemplo disso são os smartwatch leitores de pressão arterial, de padrão de sono, de detecção de arritmias. Eles podem apenas oferecer um dado a mais a ser destinado à interpretação do médico. Nada mais que isso.
J.J. – Há uma evolução posológica das terapias em cardiologia a partir de novos medicamentos que podem ser feitos com infusão ou aplicação subcutânea. Poderia explicar um pouco sobre esses avanços?
Dr. Manoel – Os medicamentos são recursos imprescindíveis. O uso racional dos fármacos é um dever do médico. Quanto menos invadimos o corpo humano, menos lesões causaremos. Mas, não podemos nos iludir, achando que os procedimentos são inofensivos. Um exemplo disso são os procedimentos minimamente invasivos, como a revascularização miocárdica percutânea (feita com a utilização de cateteres, sem cortes). Até bem pouco tempo, um marcapasso transcutâneo não era realidade e hoje já faz parte da maioria das rotinas. Todavia, a mensagem a ser deixada não é pela via de aplicação, ou pela aparente baixa carga de um ou outro remédio. O objetivo primeiro é obter eficácia, sabendo que a maior parte das doenças cardiológicas são crônicas e progressivas, necessitando uso contínuo de fármacos. Os insumos médicos, por sua vez, são muito dispendiosos. O valor para aquisição é um impeditivo num país com enorme injustiça social. O sistema de dispensação, sim, deve ser fácil e não a forma como o medicamento irá penetrar no organismo.
J.J. – E como está a relação das pessoas com a prevenção às doenças cardiovasculares? Elas têm procurado se prevenir?
Dr. Manoel – A prevenção sempre foi negligenciada. É próprio da natureza humana acreditar haver um remédio para tudo, uma pílula ou uma injeção para ser usada e acabar com todas as doenças, sem se preocupar em fazer a sua parte. A prevenção começa pelo meio ambiente. Não se pode falar em prevenir doenças respiratórias, por exemplo, se não nos atentarmos para as mudanças climáticas. Um idoso que vive na nossa região sofre com a baixa umidade e vai adoecer mais por isso. Ele sabe da necessidade de se exercitar, mas como se expor a uma temperatura ambiente tão hostil?
J.J. – Alguns saudosistas costumam lembrar que, no tempo dos nossos avós, a comida era preparada na banha de porco; inclusive a conservação da carne, mesmo a bovina, era feita nessa gordura, acondicionada em lata. O que mudou desses tempos para os atuais em relação a dieta e os riscos cardiológicos?
Dr. Manoel – Não são os saudosistas que lembram de tempos idos. O que faz a população pensar dessa forma é a extrema divulgação de notícias sem nenhuma comprovação científica. As mídias sociais lucram por alardear o que as pessoas querem ouvir. Se há cinquenta anos, no tempo da transição demográfica, a culinária no país era diferente, isso acontecia exatamente pela falta de informação. No tempo dos nossos avós, a mortalidade era maior, a expectativa de vida idem. Hoje atingimos mais de setenta anos com saúde. No tempo da gordura de porco não chegávamos aos sessenta. Todas essas mentiras atendem a um só objetivo, que é a desinformação. Existem muitos indivíduos portadores de diploma de médico falando besteiras sem fim. Esses espertalhões só estão à procura do lucro advindo dos aplausos. Ninguém faz sucesso dizendo que o melhor é seguir as recomendações das sociedades de especialidades. Devemos fazer cinquenta minutos de atividade física cinco dias pela semana por toda a vida. Isso é fato. Aconselhar as pessoas a ingerirem lixo, como ômega três, colágeno, cúrcuma, magnésio, vitamina de forma injetável é burrice. Porém, ninguém está impedido de sustentar falsas promessas.