- Luiz Carlos Seixas
“Maria é mulher de malandro/Por isso tem que sofrer/Lava até tarde da noite/E amanhece pra estender”. Quando o povão se ligou no balanço de Leninha e na força deste refrão, era fácil prever que Mulher de Malandro, uma composição de Luiz Carlos Seixas, pintaria como primeiro lugar (…) Com raríssimas exceções, em matéria de criatividade, a rapaziada vai muito bem obrigado. Coisas de bom gosto e talento foram oferecidas de bandeja ao enorme e entusiasmado público que aplaudiu e vaiou, mas nunca se manteve indiferente, alheio ao que se passava no palco. (Deonel Rosa Júnior, na sua coluna Contexto, Jornal de Jales de 8/12/1973)
Me agrada iniciar com essas palavras do Deonel. Quando há pouco lhe telefonei para lembrar que aquele festival está fazendo 50 anos, ele se assustou. É compreensível. Deonel está por trás e por dentro de tudo que acontece na cidade e, nessa correria, nem notou que meio século tinha se passado.
O quinto (e último) Festival Regional da Canção Estudantil (FERECE) teve como palco o Cine Jales. As 46 músicas inscritas foram apresentadas em duas eliminatórias, em 29 e 30 de novembro; sendo as 16 finalistas reapresentadas na noite de sábado, 1º de dezembro de 1973. Eram músicas compostas e interpretadas por estudantes de Jales e de oito cidades da região. Jayne Molina, por exemplo, veio de Paranapuã e ficou em 4º lugar com Novo Amor, de sua autoria.
O corpo de jurados mostrou a capacidade de articulação do professor Ariovaldo Luiz de Moura: Wanderley Garcia (Rádio Cultura), Joaquim Godoy (Rádio Assunção), Jerônimo Garcia Ferreira (Instituto Musical Santa Cecília), Marino Manela (Clube do Ipê), José Mendes Ferreira (APAE), Rubens Figueiredo (Delegacia Seccional de Polícia), Antonio Carlos Silva (Rotary), Elias Moyses Elias (Lions), Lair Seixas Vieira (Câmara Municipal), Alice Canhada Amadeu (Prefeitura Municipal), Marlene Fausto Garcia (APM) Zuleica Carvalho Moreira (Jornal de Jales) e Lourival Rodrigues de Sousa (IEEEJ).
Para uma cidade de aproximadamente 40 mil habitantes (incluindo a população dos distritos, Pontalinda e Vitória Brasil), era um júri altamente representativo. Talvez ficasse completo com a presença do padre José Jansen, entusiasta das companhias de Folia de Reis, e do professor Osvaldo Soler, que por aqueles dias havia conseguido em Brasília o reconhecimento oficial para a sua Faculdade de Filosofia. Ciências e Letras.
O prefeito de então era Honório Amadeu, que iniciava o seu segundo mandato. E os nossos telefones ainda só tinham três algarismos. O do dr. Edson Freitas de Oliveira, por exemplo, era o 119; o do Rollemberg era 174… e a Central Telefônica anunciava a instalação de 10 orelhões. “Orelhões são aparelhos telefônicos que, instalados nas ruas da cidade, são de grande utilidade pública”, informava a CTJ. Para a edição de Natal daquele ano, o Jornal de Jales anunciava uma retrospectiva com os principais acontecimentos do ano: Carnaval, fundação da APAE, Festival do Folclore, Facip, Festival de Montaria, Festival da Canção, inauguração da “Nova Cultura”.
Assim era a Jales de 1973. Acho importante lembrar, porque, só assim, poderemos entender o sucesso de público daqueles festivais de música. Como Leninha conta no documentário “O som da memória”, de Natália Márquez e Bruna Abigail, os FERECE atraíam mais público do que o basquete jalesense levava à quadra que existia na esquina onde depois construíram o Shopping Giraldelli.
Encerro agradecendo as pessoas que de alguma forma são responsáveis pela vitória de Mulher de Malandro, 50 anos atrás: os professores Ariovaldo, Jerônimo e Heleni Cherubini, e minha mãe. Foi ela quem me ensinou que para ganhar um festival de música eu teria que fazer uma música para a Leninha cantar. E foi o que eu fiz, aos 15 anos de idade, voltando à noitinha de trem de Urânia pra Jales.
Sobre o título dessa matéria: ao contrário de nós, ao contrário da cidade de 1973, a música continua a mesma – só ela. É o mesmo samba ingênuo que eu, na época, tocava com três ou quatro acordes.