“Moro num país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza”. A letra da antiga canção deixava nosso coração juvenil estufado de orgulho, mas, com o passar do tempo, fomos percebendo que apenas a beleza do Brasil não representava muita coisa na hora de comer, trabalhar e sonhar em ter vida próspera. Os fragmentos da nação retalhada pela inabilidade política e pela fraca percepção de cidadania nos fez acordar para a realidade de que nem todos tem condição de possuir “um fusca e um violão”, conforme a canção. Afinal, é possível progresso sem cidadania? Como uma cosmovisão cristã pode ser inserida na construção cidadã?
Quando falamos sobre cidadania imediatamente somos levados aos conceitos de Roma e Grécia antiga. Naquele arquétipo de democracia o simples fato de ser morador da pólis era elemento que credenciava a pessoa a participar normalmente das decisões da vida pública. No discurso histórico isso parece bonito, mas não quando se sabe que estrangeiros, mulheres e escravos não tinham esse direito. Assim, essa democracia seletiva continuou a ser reproduzida em outros tempos e lugares. O sociólogo, professor e político brasileiro Liszt Vieira afirma que as revoluções americana (1776) e francesa (1789) pavimentaram o caminho para o advento da cidadania moderna, afirmando que todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos, através dos quais os ideais de liberdade civil de consciência, expressão, opinião, associação e direito de propriedade poderiam ser desenvolvidos.
Ainda que o homem tenha adquirido direitos relativos ao trabalho, saúde, educação e outros, há um grande esvaziamento da ideia que o conceito de cidadania carrega consigo. É comum pessoas pensarem que ser cidadão significa apenas ter direito a alguma coisa, algum bem que o Estado lhes proporciona. Nesse caso, a pessoa se coloca em um espaço e momento histórico apenas para reivindicar bens para si ou para um grupo e, ao mesmo tempo, buscar a proteção da lei na defesa de seus interesses.
Embora essa atitude reivindicatória seja legítima e necessária, é um erro pensar em cidadania somente nestes termos. Essa ideia se completa quando vemos que cidadania é também o ato de manter os bens e direitos que o Estado proporciona. A responsabilidade de contribuir para o bem da coletividade, de assegurar a prática do bem comum é um dos aspectos mais relevantes do conceito de cidadania. A falta de consciência de cidadania pode ser observada em nossa sociedade quando vemos desrespeito aos bens públicos e destruição de nosso próprio espaço. A sociedade organizada representa um espaço público para que possamos agir de forma relacional e política no sentido de defender igualmente tanto nossos direitos quanto nossos bens. Quando cada um ocupa o seu lugar social com consciência, torna-se possível construir e incorporar na sociedade valores que a representam e lhes dá identidade.
A união da educação com a inclusão de valores éticos possibilita uma nova visão sobre os desafios da vida social. Uma pessoa não educada terá dificuldade em cumprir sua função social e desfrutar de seus direitos. Portanto, o grande desafio que educação e cidadania nos propõem é refletirmos sobre nossa participação histórica e sobre o papel que a fé cristã e a educação de qualidade representam neste processo. É possível ter consciência de que a fé cristã pode alcançar a vida social, pois isso trará clareza sobre o tipo de educação que queremos ter, da prática cidadã que desejamos e como podemos alcançar isso.
Próximo mês voltaremos ao assunto, se Deus quiser. Até lá.

Rev. Onildo de Moraes Rezende (Pastor da Igreja Presbiteriana de Jales, Bacharel em Teologia, Licenciado em Pedagogia, Pós-Graduado em Docência Universitária, Mestre em Aconselhamento)

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