Aqui não tem vítima. Teve. Quando recebi o “sim” para o diagnóstico de fibromialgia, fui ao chão e passei por um longo período sombrio, solitário, doloroso e medroso. Acalme-se, não vim assustar, nem desmotivar e nem escurecer ninguém. Muito pelo contrário. Mas para falar de tratamento, de esperança, de cura, de vida… É preciso compreender e respeitar o outro lado, que é a REALIDADE. Vamos “começar do começo”. Fibromialgia é uma síndrome dolorosa difusa de característica não inflamatória, de intensidade variável e que deve persistir por mais de 3 meses, por isso se caracteriza como dor crônica. Sua causa é desconhecida, mas se a pessoa tem pai ou mãe com fibromialgia, a chance de ter, aumenta, então a origem pode ser parte genética e por fatores externos como gatilhos infecciosos, cirurgias, estresse pós traumático e outras doenças associadas que geram dor (a pessoa já tem outra comorbidade) como Lúpus, Artrite Reumatoide, dentre outras. A Fibromialgia acomete várias vias neurológicas de dores (é complexo). Mas o que precisamos entender é que a via que avisa o cérebro que a gente está com dor e a via que sai do sistema central e tem a capacidade de diminuir a intensidade da dor estão comprometidas em quem tem a síndrome dolorosa, portanto, as dores persistem na gente. E é por isso, também, que as pessoas vivem falando que fibromialgia é uma doença psicossomática. Mas não é! O que acontece também com a pessoa que tem dor constante é que ela não tem condições de ser feliz, alegre e bem humorada a todo momento.
2% a 4% da população tem fibromialgia
Certo. Então, da sensibilização central, isto é, o Sistema Nervoso Central ficar em estado persistente de reatividade aos estímulos dolorosos e dor generalizada crônica, outros são os sintomas da fibromialgia: sono não reparador; fadiga crônica, alteração do humor: caracterizado por depressão, ansiedade, angústia; dores de cabeça, inchaço no corpo e não só em articulações, síndrome do intestino, alteração sensitiva, sensação de queimação, (principalmente nos ombros, peito, tórax e abdômen); alterações cognitivas (memória, atenção, raciocínio lógico, tomada de decisão, flexibilidade cognitiva, dificuldade de mudança rápida de pensamento, entre outros, também chamado de FIBROFOG); distúrbio alimentar (alternância entre comer demais ou não comer) e, alterações da função sexual: não só diminuição da libido, como também dores durante o ato sexual e a vulvodínia, o toque na vulva é interpretado como dor.
Como pode ver, a lista é gigante, mas não é uma sentença de morte, nem é certo que um paciente fibromiálgico terá todos os sintomas, mas para ter a fibromialgia, é certo que deva ter muitos deles, em baixo ou alto grau, infelizmente. Aí, entramos no diagnóstico, que é clínico, ou seja, acontece dentro do consultório médico, não é com exame de sangue, com ressonâncias ou raios-x. Junto desses sintomas, há a presença dos pontos gatilhos pelo corpo detectados pelo reumatologista, que é quem cuida do fibromiálgico.
Falando em pontos, atenção para alguns importantes: a experiência de dor é única e exclusiva em cada ser, não se deve comparar, subestimar ou inferiorizar, principalmente se não for sua. Não é porque as dores da fibro estão por dentro (carne, músculos, tecidos) e que ninguém vê, que elas não existem.
Fibromialgia: Dores invisíveis (Parte II)
O tratamento para a fibromialgia envolve remédios e atitudes. Não existe medicação específica, mas sim uma combinação eficaz com antidepressivos, anticonvulsivantes, ciclobenzaprina, analgésicos e opioides. Todos prescritos por um ou vários médicos, já que a síndrome deve ser um tratamento multidisciplinar. Como a dor é experiência única, os sintomas também são peculiares e investigações para averiguar tais relações se fazem importantes. Veja que então, elevamos a qualidade de vida, pois o paciente sempre está zelando pela saúde.
Mas isso não acontece tão logo. Passado o susto do diagnóstico, vem a redenção do corpo à doença e ao começar a lutar, passa por vários estágios, que oscilam muito, até ter um entendimento real de tudo.
E aí, entramos num campo importante, delicado e muito potente: o tratamento não farmacológico. Entenda, que uma coisa não anula a outra. Vá testando os remédios até que se encaixem perfeitamente. Ok. Mas junto disso, há muito o que ser feito. Não há ordem e nem receita de bolo, há o que é melhor para você. Primeiramente é procurar um bom psicólogo/terapeuta, aquele profissional que lhe deixa à vontade para você se desmontar e se refazer. A terapia lhe acende globalmente para entendimento, aceitação e tratamento da autoestima, amor próprio, autoconhecimento.
Enquanto as sessões de terapia acontecem, você deve se exercitar. Não é ser a próxima promessa olímpica e nem fazer porque todo mundo está fazendo. É fortalecer todo o corpo e liberar todos os hormônios bons, é socializar, amar você. Importante, portanto, escolher o que você pode fazer dentro das suas limitações, informar ao treinador ou profissional que cuidará da sua saúde sobre tudo o que tem e fazer no seu tempo. Alimentação também é um ponto importante dentro da realidade de um fibromiálgico: tudo em exagero faz mal e há alimentos que inflamam e que, portanto, pioram alguns sintomas.
“Primeiramente é procurar um bom psicólogo/terapeuta, aquele profissional que lhe deixa à vontade para você se desmontar e se refazer.”
Alongar, meditar, estudar, receber massagens, ler, assistir suas séries preferidas, viajar, aprender a falar “não” para determinadas pessoas, lugares e situações, desfazer relações tóxicas, tomar café com as amigas, se escolher em primeiro lugar também são sugestões que fortalecem seu ecossistema inteiro. A lista pode ser continuada por você e o que é mais legal: ela é muito maior do que a lista de sintomas da fibro. Muita esperança e vida!
Há milhões de pessoas com dores invisíveis pelo mundo. Algumas delas devem passar por você diariamente. Você não consegue ver, mas talvez já tenha julgado ou malfalado essa pessoa por ela não corresponder à vida, mesmo não aparentando nada. Ou talvez não tenha percebido, pois ela já se acostumou com as dores, está num dia sem muita dor ou a maneira dela encarar as questões é diferente. Você sabe? Nem eu sei. O que sei com a verdade do meu coração é que: o que mais doi é o preconceito.
Eu disse, a ciência diz e não vamos questionar: fibromialgia é crônica. Mas também digo que há um Deus em forma de muitas “coisas” capazes de nos manter numa chama ardente de esperança, luta, qualidade e amor. Isso tudo quase cura. Perceba. Eu creio. Obrigada.
Ana Caparroz
(Jalesense, jornalista, paciente de fibromialgia e fundadora do Dores Invisíveis @doresinvisiveis)