“Todo dia a mesma noite” é o título de um livro da jornalista Daniela Arbex sobre o incêndio na Boate Kiss que matou 242 pessoas e feriu outras quase 700 em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, em 2013. Precisa ser lido por todos, mas não é sobre ele que vou tratar dessa vez.
Parafrasearei o nome da obra para pensar nas manchetes dos jornais brasileiros todo início de ano. Poderia ser: “Todo verão a mesma tragédia”. Desabamentos, soterramentos e mortes nas encostas do país na temporada de chuvas que, diga-se de passagem, está ficando cada vez mais descontrolada devido às mudanças climáticas (sim, elas existem nessa Terra que não é plana!).
Segundo registros oficiais, de 1988 a 2022, 4.146 pessoas foram vitimadas em 16 estados, 269 municípios e em 959 eventos. As principais cidades estão localizadas na região serrana do Rio de Janeiro, sendo elas Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo.
Nem me recuperei da cena do adolescente, desesperado, sobre o ônibus arrastado na correnteza em Petrópolis – e de onde ninguém se salvou – e agora são as cenas de São Sebastião, no litoral de São Paulo, que me emocionam e entristecem. De quem é a culpa dessa tragédia, Deus?
A resposta é fácil e não está no plano divino. A culpa é de quem permite as construções em locais de risco. Do político – do Executivo ou do Legislativo – que não coloca em prática (ou fiscaliza) um Plano Diretor baseado em políticas públicas que garantam a segurança de todos e não apenas dos mais ricos.
Do servidor público que fecha os olhos para as construções irregulares, estejam eles no Ministério Público, nas polícias, nos departamentos de fiscalização.
E a culpa também é da pobreza, sempre ela. A má distribuição de renda desse país obriga todas aquelas pessoas a colocarem suas vidas em risco diariamente porque só lá na encosta, onde ninguém em sã consciência quer, é possível comprar um terreninho, construir um puxadinho, para ficar mais perto do trabalho nos condomínios de luxo e resorts.
Ou alguém aqui acha que todos aqueles infelizes moram em área de risco porque desejam?
O governo do Estado sabia das chuvas torrenciais. As prefeituras da região também foram avisadas. Mas não havia sirene para alertar a população. Quase ninguém viu as mensagens de texto enviadas para os celulares. Ou os avisos postados nas redes sociais. E ainda que tivessem visto, para onde correr?
Qual cidade você conhece que tem planos emergenciais para desastres naturais? O que fazer se a sirene tocar? Para qual abrigo ir? Sim, porque não basta avisar, é preciso recepcionar, acolher, salvar.
Mas todo verão é a mesma coisa. Até quando?

Ayne Regina Gonçalves Salviano (É MBA em Gestão. Mestre em Comunicação e Semiótica. Empresária do ramo educacional em Araçatuba e Birigui)

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