MEDICINA/EVIDÊNCIA
As mulheres da minha vida sempre disseram que o vermelho me cai muito bem. Elas afirmam que a cor combina com o tom da minha pele. Foi por este motivo que comprei uma camiseta polo de jacarezinho paraguaio e saí de casa “me achando”, como se diz por aí. Fui ao banco com ela e imediatamente me notaram, me fazendo sentir um milionário. Até o gerente se levantou pra me cumprimentar (Na verdade, ele estava saindo da mesa do funcionário para ir até a sua, mas no caminho aproveitou para me lembrar da prestação do financiamento que estava prestes a vencer). Contudo, o que importa é ter me notado e podido admirar minha camiseta vermelha. Certamente engrossou o fã clube.
Outra coisa que sempre me fez sentir especial é um hábito que adquiri ainda nos primeiros anos de escola: em toda semana da pátria finco uma fitinha verde e amarela no lado esquerdo do peito. Fui ensinado que isso fortalece a presença cívica do homem, significando um tributo à pátria, em reconhecimento à sua proteção. Ao menos uma vez por ano temos a oportunidade de homenagear os grandes heróis e relembrar seus feitos. Muitas vezes me senti o próprio José Bonifácio influenciando a independência.
Mas, desde o ano passado fui privado desses dois prazeres. Explico:
– Fiz uma chamada de vídeo para conversar com um amigo muito querido e aproveitei para me mostrar bonito. Vesti minha camiseta vermelha de jacarezinho paraguaio e procurei a melhor iluminação, sem deixar de privilegiar os ângulos que mais me favorecem. Pois não é que aquele meu amigo distante me perguntou se eu havia virado petista!?!? Tudo por causa da cor que – com certeza – me deixa tão guapo.
– No dia da Pátria repeti o costume de reverência à mãe gentil. E pra minha surpresa fui taxado de partidário de um presidente cujo nome sequer pronuncio no meu cotidiano. E foi só por isso que tomei a decisão de doravante levar o meu jacarezinho paraguaio pra passear quando eu estiver em presença das mulheres de minha vida, que à propósito, são minha mãe e minha avó, e só usar a fitinha presa ao meu pijama de ursinho.
E, para que não pensem que essa confusão é algo restrito ao meu espelho, saibam que o mesmo se dá na esfera da querida ciência. Enquanto à primeira vista acreditam que a vitamina D protege e diminui a mortalidade de quem está infectado por COVID-19, assim como acreditaram que minha linda camiseta ou a minha fitinha estivessem ligadas a um ou outro partido político, isso não procede. Quem viu a cara, ou seja, enxergou que as pessoas com valores baixos da vitamina tiveram mais complicações, não viu o coração, que pulsava dizendo que a reposição daquela substância não preveniu novos casos, nem diminuiu gravidade. (Int J Clin Pract. 2021 Nov;75(11):e14675. doi: 10.1111/ijcp.14675. Meta-Analysis).
Dr. Manoel Paz Landim
(Cardiologista, Mestre em Medicina pela FAMERP, Preceptor e Médico do Ambulatório de Hipertensão do Departamento de Clínica Médica da FAMERP, São José do Rio Preto)