MEDICINA/EVIDÊNCIA

A cidadezinha em que nasci deixou profundas marcas nas minhas lembranças. Ali, nos anos setenta, o trânsito era fácil, as distâncias sempre pequenas e ela tinha também outras características que eu só viria saber bem mais tarde não serem comuns a todas as outras, principalmente aos centros maiores. Na nossa terrinha não conhecíamos a necessidade de trancar as portas dos carros e dos portões, nem a prudência ao lidar com “estranhos”. O tempo passou e eu não me tornei um Alberto Caieiro, a louvar o bucólico e preferir a simplicidade em detrimento do chamado progresso.
Ao contrário do que se poderia pensar, minha vilinha é inovadora de nascença. Foi nela, por exemplo, que surgiu o Instagram. Sim, é verdade! O que o brasileiro Mike Krieger (que deve ter ouvido falar de nós) e o Kevin Systrom fizeram foi colocar a ideia na internet em 2010 e receber o bilhão do Zuckerberg no ano seguinte. Quem não acreditar pode perguntar para qualquer conterrâneo meu, que certamente se lembrará dos passeios que fazíamos pelo Foto Morita e Kido Fotos para apreciar nas suas vitrines os retratos recém revelados das festas que movimentaram a sociedade poucos dias antes.
Vá dizer que não é o mesmo que fazemos hoje nos stories e no feed de notícias da rede (?)
Claro que a história da minha terra também tem acontecimentos que gostaríamos que ficassem esquecidos. Foi o que se deu quando fizemos parte do FEBEAPÁ (Festival de Besteira que Assola o País). Sergio Porto/Stanislaw Ponte Preta fez todo o país rir do comportamento de um de nossos mais competentes advogados – e então vereador – que empastelou a redação do jornal que havia associado a sua figura a de um burro. O mote foi: não faça como o burro que não lê “A Folha da Região” (No livro, o cronista deu o título de “Outra de Burro”).
Mas, vergonha mesmo, passam outras cidades do país. E em esfera mundial:
A publicação médica de maior fator de impacto científico no mundo, o Lancet, acabou de publicar uma notícia que seria capaz de fazer corar o próprio Sergio Porto. Os autores, pertencentes à FIOCRUZ, UnB e UFRJ, estudaram 5570 cidades brasileiras e concluíram que aquelas que deram a vitória ao presidente Bolsonaro em 2018 foram as que tiveram maior número de mortes por COVID-19. Mesmo municípios das regiões mais ricas, como os do eixo Sul-Sudeste, tiveram mortalidade maior que o de regiões pobres como as do Norte-Nordeste, evidenciando claramente o peso de medidas equivocadas para o tratamento da doença.
Não. Eu não sou eleitor do Lula.
(A íntegra do artigo pode ser conferida na publicação original sob o título “Involvement of political and socio-economic factors in the spatial and temporal dynamics of COVID-19 outcomes in Brazil”: A population-based study:March 14, 2022DOI:https://doi.org/10.1016/j.lana.2022.100221).

Revista cientifica Lancet: cidades onde o presidente Bolsonaro ganhou tiveram maior número de mortes por Covid-19 // Foto: Internet

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