Deu na folha: a pessoa mais velha do mundo se chama Maria Branyas, tem 116 anos e vive na Catalunha, Espanha. Se fosse um bugre do cerrado ou caatinga, teria vivido os mesmos desgostos, ouvido e falado coisas das quais preferiria não ter nem lembranças.
Sobre a Dona Maria, mesmo não tendo detalhes da sua vida, é fácil imaginar como as coisas devem ter sido. Em 1925, aos dezoito anos de idade, seu pai deve ter reclamado do comprimento do vestido. Mesmo se arrastasse pelo chão, estaria curto aos olhos do velho. Horário de moça de respeito chegar em casa é antes do pôr do sol, mesmo devidamente acompanhada.
Seu primeiro amor, aos treze anos, teria sido por um rapaz mais velho. Um moço de cabelo engomado, calção amarrado no joelho, meias e pulôver, numa moda mal vista pela velha sociedade. Como pais e mães sempre foram os mesmos, a coitada foi obrigada a calar o sonho. Eles não permitiram nenhuma aventura. Pronto! Aí aconteceu sua primeira revolta contra o mundo.
Essa historinha já fazia sentido na minha cabeça e tomou corpo depois de ler a íntegra da matéria assinada por Susana Bragatto. Dona Maria citou versos de um contemporâneo seu, reconhecendo a idade como pré-requisito para valorizar o silêncio (Tive que chegar à idade avançada para aprender a amar o silêncio / No silêncio aparecem sinais emocionados e nos cruzamentos da memória detecta nomes que o tempo pretendia apagar – Jaroslav Seifert).
É por não valorizar o silêncio que espanhóis, bugres ou qualquer caipora do oco da taboca passam pelos mesmos perrengues.
Quando se é jovem, portanto, antes da vida nos presentear com o juízo, calar a voz é uma raridade. A vida é um bate-rebate, como se os desagrados fossem uma bolinha de tênis. Na partida não se acumulam pontos, mas somamos aborrecimentos.
Nossa opinião não vai mudar o mundo. Fazer o quê? Na maioria das vezes estamos errados mesmo! O mais prudente seria lubrificar as orelhas enquanto não nos fosse dada a sabedoria. Antes de entendermos nossa própria burrice o melhor é sonhar na cama, como a jovem Dona Maria deve ter feito para esquecer o seu amor juvenil.
- Dr. Manoel Paz Landim (Cardiologista, Professor da FAMERP de São José do Rio Preto)