Um dos assuntos mais comentados na tecnosfera é o metaverso e seus prováveis impactos num futuro não muito distante, segundo apontam os entusiastas. De fato, a concepção de um mundo digital que replica a realidade por meio de tecnologias imersivas, como a realidade virtual, possui uma série de aplicações que certamente causarão profundos impactos na sociedade.
Entretanto, se trouxermos o conceito de metaverso (meta: além, verso: universo) para o momento presente, já estaremos imersos num mundo digital alternativo, repleto de teorias da conspiração, terraplanismo, fake news, guerra de narrativas, populismo e outra mazelas potencializadas ou criadas pela grande rede: o metaverso da ignorância.
Para Franklin Foer, autor da obra “O mundo que não pensa” (Editora Leya, 2019), “Facebook e Google criaram um mundo no qual as antigas fronteiras entre fato e mentira caíram por terra e as informações falsas se propagam de forma viral”. Exagerado? Talvez. Mas o fato é que a grande torrente de informações gerada pelo mundo alternativo da grande rede e seus algoritmos tendenciosos faz com que seja extremamente complicado selecionar uma informação relevante e, principalmente, distinguir fato de mentira, ainda mais quando a informação consumida causa o viés de confirmação, fazendo que com ignoremos os fatos e abracemos crenças e opiniões.


Nesse sentido, é ainda mais difícil distinguir fato de narrativa ou fato de fake news, visto que muitos produtores de conteúdo (os desonestos) que defendem crenças, políticos, partidos ou ideologias acabam fabricando suas próprias verdades por meio de técnicas de engenharia social (persuasão por meio de narrativas), criando ignorância intencionalmente.

E não se engane: todos estão suscetíveis às estratégias dos engenheiros sociais, até mesmo aqueles que possuem formação.
A produção de ignorância de maneira intencional foi discutida pelo historiador estadunidense Robert C. Proctor, que cunhou o termo agnotologia, definido por ele como o estudo da dúvida induzida culturalmente, principalmente por meio da produção de dados aparentemente verdadeiros. Em um estudo publicado em 2008, Proctor revela as estratégias usadas pela indústria do tabaco no século passado para manipular informações sobre os males causados pelo consumo de cigarro e neutralizar esforços antitabagismo. Se numa época em que a web sequer existia, os engenheiros sociais já espalhavam a ignorância e a desinformação, imagina hoje com toda essa conectividade, em que estamos constantemente consumindo informações.
Clay A. Johnson, na obra “Dieta da Informação” (Novatec Editora, 2012), que faz uma analogia entre a dieta alimentar e o consumo de informações, já havia alertado sobre os perigos do consumo enviesado de tudo que a grande rede produz: “…a afirmação daquilo em que você acredita é o açúcar da mente. Uma dieta da informação saudável significa buscar a diversidade, tanto em área tópica quanto em perspectiva”.
Diante do exposto, podemos afirmar que o metaverso da ignorância antecede as tecnologias digitais, ainda mais num país em que o descaso pela educação sempre foi uma constante. De fato, nunca desenvolvemos uma cultura letrada, pulamos a era do livro diretamente para a era digital, sendo péssimos leitores, péssimos em analisar criticamente aquilo que nos é apresentado, mas excelentes em abraçar aquilo que reforça nossas crenças e opiniões.
Para Yuval Arari, historiador e autor do best-seller “Homo Deus: uma breve história do amanhã”: “No passado, a censura funcionava bloqueando o fluxo de informação. No século XXI, ela o faz inundando as pessoas de informação irrelevante”. E não só irrelevante, mas, principalmente, falsa, enviesada e oportunista.

Prof. Me. Jorge Luís Gregório (Docente da Fatec Jales)
www.jlgregorio.com.br

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